Os atuais desafios de sustentabilidade econômica do setor somados às crescentes demandas da população por melhores serviços de saúde tornam ainda mais essencial o papel do gestor hospitalar. Este papel, nos dias de hoje, vai além da liderança organizacional para prover um serviço assistencial de qualidade, garantir o bem-estar das equipes e entregar níveis sustentáveis de lucratividade e geração de caixa. Exige uma visão transformacional que identifique e implemente tecnologias capazes de trazer ganhos reais de produtividade enquanto promove a sustentabilidade ambiental.
O Prêmio Nobel de Economia de 2024, concedido a Daron Acemoglu, Simon Johnson e James Robinson por seus estudos sobre instituições e prosperidade, reforça um princípio fundamental: a inovação bem direcionada é motor de desenvolvimento econômico e social. Este deve ser um elemento central quando refletimos sobre o papel do gestor de saúde contemporâneo.
O paradoxo tecnológico na Saúde
Entretanto, é fundamental reconhecer que a tecnologia mal aplicada pode encarecer os custos do cuidado ao invés de melhorar a produtividade. Historicamente, o setor de saúde tem enfrentado este desafio: a adoção de tecnologia cada vez mais sofisticada, embora necessária, frequentemente pressiona as margens operacionais.
O atual hype em torno de inteligência artificial tornou este desafio ainda mais complexo. A ansiedade para não ficar para trás nesta revolução tem levado muitas organizações a investimentos precipitados. Estudos recentes do setor de tecnologia apontam que a maioria dos projetos corporativos de IA não atinge os objetivos esperados, sendo abandonados ou substancialmente redimensionados. Por outro lado, os ganhos potenciais são tão significativos que simplesmente esperar e observar como a tecnologia evolui no mercado para gestão hospitalar representa um risco estratégico considerável.
Casos de uso promissores em gestão hospitalar
Para o gestor hospitalar brasileiro, algumas aplicações de tecnologia já demonstram retorno consistente:
Suporte diagnóstico por imagem: A IA como segunda leitura em radiologia e patologia não substitui o especialista, mas pode aumentar a acurácia diagnóstica e reduzir o tempo de laudo. Instituições que adotaram estas ferramentas relatam ganhos de produtividade que permitem ao radiologista focar em casos mais complexos.

Inteligência Artificial não substitui o especialista, mas pode aumentar a acurácia diagnóstica e reduzir o tempo de laudo.
Otimização de fluxos operacionais: Algoritmos de aprendizado de máquina podem prever picos de demanda em pronto-socorro, permitindo alocação antecipada de recursos e reduzindo tempos de espera em até 30%. Hospitais que implementaram sistemas preditivos para gestão de leitos reportam melhorias significativas nas taxas de ocupação e redução de transferências não programadas.
Automação administrativa: A documentação clínica assistida por IA e o processamento inteligente de autorizações de convênios liberam tempo das equipes assistenciais e administrativas para atividades de maior valor. Este é frequentemente o caso de uso com retorno sobre investimento mais rápido.
Monitoramento contínuo de pacientes: Sensores e algoritmos de alerta precoce para deterioração clínica podem prevenir eventos adversos graves. A detecção antecipada de sepse ou insuficiência respiratória, por exemplo, reduz mortalidade e custos com internações prolongadas.
Gestão Hospitalar: navegando a implementação
O gestor hospitalar que desenvolver a habilidade de identificar as tecnologias mais promissoras, os casos de uso mais impactantes e, acima de tudo, conseguir mover sua organização para absorver estas inovações terá papel destacado em suas instituições. Este processo exige:
Critérios claros de avaliação: Toda tecnologia deve demonstrar como contribuirá para pelo menos um dos pilares fundamentais – melhor desfecho clínico, melhor experiência do paciente, melhor experiência da equipe ou redução de custos. Idealmente, deve impactar mais de um simultaneamente.
Projetos piloto bem desenhados: Antes de escalar qualquer solução, é essencial testá-la em ambiente controlado, com métricas objetivas de sucesso e prazos definidos para avaliação.

Testar soluções tecnológicas é indispensável antes de aplicar em qualquer processo.
Gestão da mudança: A tecnologia mais sofisticada fracassa sem o engajamento das equipes. Investir tempo no treinamento, ouvir as preocupações dos profissionais e ajustar processos é tão importante quanto a escolha da ferramenta.
Conformidade regulatória: No contexto brasileiro, qualquer inovação deve considerar as diretrizes da ANVISA para dispositivos médicos, a LGPD para proteção de dados pessoais sensíveis e as normativas do CFM quando aplicável. O atalho regulatório gera passivos futuros significativos.
Conclusão
O gestor hospitalar contemporâneo precisa ser simultaneamente visionário e pragmático: visionário para compreender o potencial transformador das novas tecnologias, pragmático para implementá-las com disciplina e rigor. Em um setor onde as margens são apertadas e o que está em jogo é a saúde das pessoas, não há espaço para modismos tecnológicos ou para a inércia.
O equilíbrio entre inovação responsável e sustentabilidade operacional será o diferencial competitivo das organizações de saúde na próxima década. Aqueles que desenvolverem esta competência não apenas sobreviverão às pressões do setor, mas liderarão sua transformação.
Artigo escrito por Fabricio Campolina
Presidente da Johnson & Johnson MedTech Brasil




